Vemos, com perplexidade, se repetirem os casos em que pessoas, entre essas, autoridades, políticos e personalidades da sociedade ou seus familiares, são abordadas pelas autoridades de trânsito e se recusam, sem nada acontecer, a fazer o teste do bafômetro.
Não há dúvida, de outro lado, do propósito dessa conduta, ou seja, evitar a demonstração de que, em desconformidade com as leis de trânsito, estavam dirigindo sob efeito de bebida alcoólica, o que é crime nos termos do Código de Trânsito Brasileiro. Ninguém é inocente o suficiente para imaginar que alguém se recusasse ao exame se não tivesse ingerido bebida alcoólica.
No entanto, o que mais causa espanto é que, afora a desfaçatez dessa conduta, é que ela não implica qualquer sanção para o indivíduo, transformando em ingênuos, para não se dizer pior, aqueles que se submetem aos testes de embriaguez.
Em uma realidade em que as mortes e as lesões graves no trânsito se multiplicam e chegam a números assustadores, em grande parte, causadas por indivíduos embriagados, e em que a sociedade clama por medidas para frear esse quadro, não se pode admitir que se mantenha, não uma brecha, mas uma porteira aberta na legislação para garantir impunidade àqueles que dirigem embriagados.
Desse modo, pela enorme gravidade e lesividade social desta conduta, é necessário que a lei tipifique como crime a recusa na realização do teste do bafômetro ou dos exames laboratoriais necessários à comprovação da embriaguez ao volante, o que desestimulará, efetivamente, sua prática e tornará possível a responsa-bilização por esse crime.
O que a Constituição federal e o regime democrático garantem ao indivíduo é o direito de defesa e a prerrogativa de se manter calado sobre o fato. Não pode, no entanto, esse direito ser interpretado ou utilizado como escudo para inviabilizar, em desconformidade com a moral e a ética, que devem pautar as leis e o comportamento social, a produção da prova para a responsabilização pela prática criminosa, o que, como se tem visto com a recusa ao teste do bafômetro, tem não só gerado a impunidade daqueles que dirigem embriagados como estimulado a prática da mesma conduta pelos mais esclarecidos, justamente pela certeza da impunidade.
José Ricardo Coutinho Silva
juiz de Direito Criminal em Porto Alegre
Correio do Povo 27/04/2012
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