Estaremos vivendo tempos de hipocrisia pessoal e ironia histórica? Ou tudo nasce do nosso farisaísmo-mandão, em que as mentiras da aparência suplantam a realidade e habitam nossa alma?
Em plena Semana do Meio Ambiente, a sapiência tecnológica da maior potência econômico-financeira e militar do planeta mostra-se impotente na solução da maior catástrofe ambiental de todos os tempos: o vazamento num poço submarino de petróleo a 1.700 metros de profundidade no Golfo do México. Em 20 de abril, a explosão duma plataforma da British Petroleum matou 11 pessoas e começou a poluir o mar com, pelo menos, 19 mil barris ao dia, uns 170 milhões de litros de óleo a cada 24 horas. A mancha chegou às costas de Alabama, Flórida, Geórgia e Louisiana, nos Estados Unidos, e o próprio Barack Obama lá esteve duas vezes: “Catastrófico”, exclamou.
O secretário de Justiça, Eric Holder, qualificou o cenário de “trágico e devastador”. Os governantes dos EUA são comedidos nas palavras (ao contrário dos nossos) e, quando chegam a dizer o que disseram, a realidade deve ser brutal e asfixiante. O manto pestilento já duplica o tamanho da Jamaica, país-ilha próximo, e pode expandir-se a todo o Caribe.
A fúria do vazamento levou ao fracasso todos os intentos de tapar o poço. Agora, limitam-se a conter a onda de óleo. Na espessa capa d’água, chegam a queimar petróleo à superfície, num fogaréu infernal que nem Dante imaginou. Os “dispersantes” químicos lançados ao mar já inundam os pântanos e mangues da costa, ameaçando o hábitat de aves e animais quase em extinção, como a tartaruga-oliva e a tartaruga-de-couro. E também a cadeia alimentar que faz possível a vida marinha.
Se a maior potência planetária não dispõe de inteligências e tecnologia para solucionar o vazamento do poço a “apenas” 1.700 metros de profundidade marítima, o que ocorrerá conosco, no Brasil, nessa ânsia de explorar rápido o petróleo do pré-sal, a 6 ou 7 mil metros, além do fundo do mar??
A tragédia do Golfo do México ocorre 24 anos após a de Chernobyl. De lá para cá, a consciência ecológica cresceu e, por isto, a desgraça atual é a maior da História, pois tínhamos conhecimento pleno da possibilidade do desastre. Além disso, a energia nuclear é recente e inventada pelo ser humano como especulação científica. Fez-se incontrolável pelo nosso desvario.
O petróleo é um legado da natureza, da Criação e da evolução vital. Com ele, porém, destruímos a vida poluindo ar e mar. Ou usando a indústria química (oriunda do petróleo) para envenenar a terra, os alimentos, a água que bebemos. A sede pelo lucro fácil (transformamos a natureza em dinheiro no bolso) nos faz cegos face à tragédia possível.
Aqui, usamos o pré-sal demagogicamente, como se fosse ente salvador, sem previsão real dos riscos e da possibilidade de solucionar os danos. E, junto a tudo que já afeta a vida na Terra, ajudamos a construir o suicídio geral. Morremos matando. Ou matamos morrendo.
Flávio Tavares
Jornalista e escritor
Fonte:Zero Hora 06 de junho de 2010 N° 16358
Em plena Semana do Meio Ambiente, a sapiência tecnológica da maior potência econômico-financeira e militar do planeta mostra-se impotente na solução da maior catástrofe ambiental de todos os tempos: o vazamento num poço submarino de petróleo a 1.700 metros de profundidade no Golfo do México. Em 20 de abril, a explosão duma plataforma da British Petroleum matou 11 pessoas e começou a poluir o mar com, pelo menos, 19 mil barris ao dia, uns 170 milhões de litros de óleo a cada 24 horas. A mancha chegou às costas de Alabama, Flórida, Geórgia e Louisiana, nos Estados Unidos, e o próprio Barack Obama lá esteve duas vezes: “Catastrófico”, exclamou.
O secretário de Justiça, Eric Holder, qualificou o cenário de “trágico e devastador”. Os governantes dos EUA são comedidos nas palavras (ao contrário dos nossos) e, quando chegam a dizer o que disseram, a realidade deve ser brutal e asfixiante. O manto pestilento já duplica o tamanho da Jamaica, país-ilha próximo, e pode expandir-se a todo o Caribe.
A fúria do vazamento levou ao fracasso todos os intentos de tapar o poço. Agora, limitam-se a conter a onda de óleo. Na espessa capa d’água, chegam a queimar petróleo à superfície, num fogaréu infernal que nem Dante imaginou. Os “dispersantes” químicos lançados ao mar já inundam os pântanos e mangues da costa, ameaçando o hábitat de aves e animais quase em extinção, como a tartaruga-oliva e a tartaruga-de-couro. E também a cadeia alimentar que faz possível a vida marinha.
Se a maior potência planetária não dispõe de inteligências e tecnologia para solucionar o vazamento do poço a “apenas” 1.700 metros de profundidade marítima, o que ocorrerá conosco, no Brasil, nessa ânsia de explorar rápido o petróleo do pré-sal, a 6 ou 7 mil metros, além do fundo do mar??
A tragédia do Golfo do México ocorre 24 anos após a de Chernobyl. De lá para cá, a consciência ecológica cresceu e, por isto, a desgraça atual é a maior da História, pois tínhamos conhecimento pleno da possibilidade do desastre. Além disso, a energia nuclear é recente e inventada pelo ser humano como especulação científica. Fez-se incontrolável pelo nosso desvario.
O petróleo é um legado da natureza, da Criação e da evolução vital. Com ele, porém, destruímos a vida poluindo ar e mar. Ou usando a indústria química (oriunda do petróleo) para envenenar a terra, os alimentos, a água que bebemos. A sede pelo lucro fácil (transformamos a natureza em dinheiro no bolso) nos faz cegos face à tragédia possível.
Aqui, usamos o pré-sal demagogicamente, como se fosse ente salvador, sem previsão real dos riscos e da possibilidade de solucionar os danos. E, junto a tudo que já afeta a vida na Terra, ajudamos a construir o suicídio geral. Morremos matando. Ou matamos morrendo.
Flávio Tavares
Jornalista e escritor
Fonte:Zero Hora 06 de junho de 2010 N° 16358