terça-feira, 8 de junho de 2010

TRÂNSITO: A TRAGÉDIA REPRISADA

Lamentavelmente, nosso trânsito continua chacinando como uma verdadeira guerra civil. A consequência é muita tristeza, famílias abaladas, sonhos abortados, vidas dilaceradas. Por óbvio, o Código de Trânsito Brasileiro (a lei) não tem o dom milagroso de converter os atuais motoristas em exemplos de prudência, responsabilidade e educação de uma hora para outra. Sem a introspecção, a intenção verdadeira e a atitude positiva para a mudança comportamental, estamos fadados a assistir à carnificina e aos destroços deixados nas vias públicas, como acontece a cada feriado.

Para começar a mudar essa realidade, é necessário romper, de uma vez por todas, com esse cinismo que qualifica a tragédia no trânsito como fatalidade. A inobservância das regras elementares do trânsito não pode ser caracterizada como acidente, pois não é obra do acaso. São eventos que podem ser evitados. Conceitualmente, portanto, não são acidentes, e sim desastres.

A capacidade de matar e ferir no trânsito suscita reflexões sobre as condutas e comportamentos humanos. A onipotência do condutor, a petulância jovial, a ousadia, a sandice e o escárnio de alguns motoristas refletem um vazio existencial, uma tentativa vã de resgatar uma autoestima debilitada. O nosso “herói automobilístico” deixa de perceber que o acelerador não é um mero dispositivo tecnológico, nem a mera extensão das suas emoções, fantasias e frustrações. E, ainda, que no trânsito não temos uma segunda chance, não há como voltar atrás do já acontecido, qual seja, a lesão, o dano, a morte.

A responsabilidade pessoal do condutor é intransferível. E, por isso, o trabalho a fazer é amansar o elemento irascível do motorista que se transforma ao volante e incorpora como extensão corpórea a sua armadura metálica nas vias públicas. A morte no trânsito não se caracteriza como fatalidade, e sim insolência, futilidade e falta de amor à vida.

A construção de um trânsito saudável e seguro exige a participação de todos os protagonistas. As decisões são pessoais, voluntárias, conscientes, intransferíveis e, portanto, individuais. Assim, a mudança dependerá de cada um de nós, e de todos nós. Mas precisamos ser radicais na defesa da vida. Precisamos de uma revolução de comportamentos, a começar pelo afastamento das subjetividades pérfidas, com ações de respeito, cidadania e corresponsabilidade social no trânsito.
Ildo Mario Szinvelski
Diretor técnico do Detran/RS

Fonte:Jornal Zero Hora 08 de junho de 2010 N° 16360

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