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terça-feira, 1 de maio de 2012

VENDE-SE A NATUREZA


Às vésperas da Rio+20 é imprescindível denunciar a nova ofensiva do capitalismo neoliberal: a mercantilização da natureza. Já existe o mercado de carbono, estabelecido pelo Protocolo de Kyoto (1997). Ele determina que países desenvolvidos, principais poluidores, reduzam as emissões de gases de efeito estufa em 5,2%.
Surge agora nova proposta: a venda de serviços ambientais
Reduzir o volume de veneno vomitado por aqueles países na atmosfera implica subtrair lucros. Assim, inventou-se o crédito de carbono. Uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) equivale a um crédito de carbono. O país rico ou suas empresas, ao ultrapassar o limite de poluição permitida, compra o crédito do país pobre ou de suas empresas que ainda não atingiram seus respectivos limites de emissão de CO2 e, assim, fica autorizado a emitir gases de efeito estufa. O valor dessa permissão deve ser inferior à multa que o país rico pagaria, caso ultrapassasse seu limite de emissão de CO2.
Surge agora nova proposta: a venda de serviços ambientais. Leia-se: apropriação e mercantilização das florestas tropicais, florestas plantadas (semeadas pelo ser humano) e ecossistemas. Devido à crise financeira que afeta os países desenvolvidos, o capital busca novas fontes de lucro. Ao capital industrial (produção) e ao capital financeiro (especulação), soma-se agora o capital natural (apropriação da natureza), também conhecido por economia verde.
A diferença dos serviços ambientais é que não são prestados por uma pessoa ou empresa; são ofertados, gratuitamente, pela natureza: água, alimentos, plantas medicinais, carbono (sua absorção e armazenamento), minérios, madeira etc. A proposta é dar um basta a essa gratuidade. Na lógica capitalista, o valor de troca de um bem está acima de seu valor de uso. Portanto, tais bens naturais devem ter preços.
Os consumidores dos bens da natureza passariam a pagar, não apenas pela administração da “manufatura” do produto (como pagamos pela água que sai da torneira em casa), mas pelo próprio bem. Ocorre que a natureza não tem conta bancária para receber o dinheiro pago pelos serviços que presta. Os defensores dessa proposta afirmam que, portanto, alguém ou alguma instituição deve receber o pagamento – o dono da floresta ou do ecossistema.
A proposta não leva em conta as comunidades que vivem nas florestas. Uma moradora da comunidade de Katobo, floresta da República Democrática do Congo, relata:
“Na floresta, coletamos lenha, cultivamos alimentos e comemos. A floresta fornece tudo, legumes, todo tipo de animal, e isso nos permite viver bem. Por isso que somos muito felizes com nossa floresta, porque nos permite conseguir tudo que precisamos. Quando ouvimos que a floresta poderia estar em perigo, isso nos preocupa, porque nunca poderíamos viver fora da floresta. E se alguém nos dissesse para abandonar a floresta, ficaríamos com muita raiva, porque não podemos imaginar uma vida que não seja dentro ou perto da floresta. Quando plantamos alimentos, temos comida, temos agricultura e também caça, e as mulheres pegam siri e peixe nos rios. Temos diferentes tipos de legumes, e também plantas comestíveis da floresta, e frutas, e todo de tipo de coisa que comemos, que nos dá força e energia, proteínas, e tudo mais que precisamos.”
O comércio de serviços ambientais ignora essa visão dos povos da floresta. Trata-se de um novo mecanismo de mercado, pelo qual a natureza é quantificada em unidades comercializáveis.
Essa ideia, que soa como absurda, surgiu nos países industrializados do hemisfério Norte na década de 1970, quando houve a crise ambiental. Europa e EUA tomaram consciência de que os recursos naturais são limitados. A Terra não tem como ser ampliada. E está doente, contaminada e degradada.
Frente a isso, os ideólogos do capitalismo propuseram valorizar os recursos naturais para salvá-los. Calcularam o valor dos serviços ambientais entre US$ 16 e 54 trilhões (o PIB mundial, a soma de bens e serviços, totaliza atualmente US$ 62 trilhões). “Está na hora de reconhecer que a natureza é a maior empresa do mundo, trabalhando para beneficiar 100% da humanidade – e faz isso de graça”, afirmou Jean-Cristophe Vié, diretor do Programa de Espécies da IUCN, principal rede global pela conservação da natureza, financiada por governos, agências multilaterais e empresas multinacionais.
Em 1969, Garret Hardin publicou o artigo “A tragédia dos comuns” para justificar a necessidade de cercar a natureza, privatizá-la, e assim garantir sua preservação. Segundo o autor, o uso local e gratuito da natureza, como o faz uma tribo indígena, resulta em destruição (o que não corresponde à verdade). A única forma de preservá-la para o bem comum é torná-la administrável por quem possui competência – as grandes corporações empresariais. Eis a tese da economia verde.
Ora, sabemos como elas encaram a natureza: como mera produtora de ‘commodities’. Por isso, empresas estrangeiras compram, no Brasil, cada vez mais terras, o que significa uma desapropriação mercantil de nosso território.
Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais
Artigo publicado originalmente no portal Adital
Fonte:Correio do Brasil 30/04/2012

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Brasil impõe condições para discutir economia verde na Rio+20, afirma ministro do Desenvolvimento Agrário


O governo brasileiro só admite discutir o conceito de economia verde na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, se envolver sustentabilidade e desenvolvimento social.   A declaração foi feita hoje (24) pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas. Ele reflete a preocupação brasileira de que o tema seja usado pelos países desenvolvidos para impor medidas protecionistas.
“Não há problema em discutir o conceito, desde que signifique uma economia que vise às atividades econômicas e à inclusão social em primeiro lugar. Atividades econômicas que visem à inclusão social, redução de emissão de carbono, preservação dos recursos naturais estratégicos”, disse. “Se for dentro desses termos, não teremos problemas em discutir. Se for para justificar outras coisas, não queremos discutir a economia verde”, completou.
A economia verde é um dos principais temas a serem discutidos na Rio+20. Entretanto, ainda não há consenso sobre o assunto. Segundo negociadores brasileiros, a dificuldade está na desconfiança de países em desenvolvimento de que o instrumento crie brechas para, no futuro, justificar medidas protecionistas, como barreiras comerciais, imposição de padrões tecnológicos e pré-condições para receber ajuda externa.
Agência Brasil 24/04/2012

sábado, 14 de abril de 2012

Cúpula dos Povos pretende lutar contra mercantilização da natureza

Em contrapartida à tese da ONU, a Cúpula dos Povos pretende mostrar que existem saberes entre as populações tradicionais e alternativas reais que estão sendo construídas por grupos sociais no mundo todo.





Por Alana Gandra - Agência Brasil
O principal desafio que a Cúpula dos Povos por Justiça Social e Ambiental terá que enfrentar é a desconstrução das propostas que dominam a agenda oficial da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, programada para junho próximo, no Rio. A Cúpula dos Povos está sendo organizada por movimentos da sociedade civil e ocorrerá paralelamente à Rio+20, no Aterro do Flamengo. A conferência da ONU tem três temas centrais: economia verde, erradicação da miséria e governança global.
Para a representante do Comitê Facilitador da Sociedade Civil para a Rio+20 e diretora da organização não governamental Fase-Solidariedade e Educação, Fátima Mello, a meta da Cúpula dos Povos é, “de um lado, desconstruir essas ilusões e as teses da agenda oficial e, de outro, transmitir a mensagem de que o mundo passa por uma crise global sem precedentes. Essa crise será enfrentada por meio de soluções, cujo caminho é o fortalecimento dos direitos, a recuperação dos bens comuns, ao contrário da mercantilização da natureza, que a agenda oficial propõe”.
Fátima Mello destacou a necessidade de que bens comuns, como a água, a terra, o ar, as florestas, e o solo urbano sejam apropriados coletivamente e não pelo mercado financeiro. Durante as atividades que serão promovidas durante a Cúpula dos Povos, no período de 15 a 23 de junho, o objetivo é promover um diálogo amplo com a sociedade.
Ela definiu como um risco a percepção da ONU em relação às novas tecnologias que integram a chamada economia verde. “Elas podem ser uma enorme fonte de lucro para as grandes indústrias e corporações que produzirão essas novas tecnologias e manterão a propriedade intelectual sobre elas, aumentando assim a distância entre os que têm acesso e os que não têm”. A diretora acredita que isso tornará os países mais pobres ainda mais dependentes dos ricos.
Para Fátima Mello, não existem garantias de que essas novas tecnologias serão apropriadas como deveriam, isto é, como um bem comum. “Nós temos visto exatamente o contrário. Que as tecnologias são criadas para gerar mais lucro e mais concentração de saber. Elas não são amplamente socializadas”. Na sua opinião, a economia verde, cujo foco são as novas tecnologias, é um grande risco.
Em contrapartida à tese da ONU, a Cúpula dos Povos pretende mostrar que existem saberes entre as populações tradicionais e alternativas reais que estão sendo construídas por grupos sociais no mundo todo, que têm de ser recuperados e valorizados. A agroecologia e o campesinato são alguns, citou Fátima. “Esses saberes que estão sendo jogados no lixo e substituídos pelo da grande agricultura industrial, voltada para a exportação, nós precisamos recuperar”.
Sobre a posição brasileira na Rio+20, a diretora disse que esperava uma postura mais ousada. “Nós esperávamos que o Brasil, como anfitrião e país megadiverso, tivesse uma postura, uma iniciativa mais ousada e proativa, no sentido de enfrentar os problemas do planeta”. Ela lembrou que a estratégia e o papel da Cúpula dos Povos é “botar o dedo na ferida, exigir, pressionar e mobilizar a população para que cobre soluções muito mais amplas e profundas do que os governos estão propondo”.

Agência Brasil/EcoAgência

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

AFINANDO O DISCURSO CONTRA A ECONOMIA VERDE

Seminário debate os conceitos e negócios por trás do modelo que será defendido pela ONU na Rio+20 e expõe os riscos da Economia Verde para a qualidade de vida no planeta.



Por Raquel Júnia - Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz)
No "esboço zero", documento divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) como base das discussões da Rio+20 - Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável - fica claro que a proposta defendida pela Organização durante o evento será a da Economia Verde. A Rio+20 vai acontecer em junho de 2012, no Rio de Janeiro, e, paralelamente, movimentos sociais e outras entidades da sociedade civil organizarão a Cúpula dos Povos, que pretende questionar as soluções da ONU para a atual crise ecológica. "Disfarçada de uma agenda ambiental, a Rio+20 traz uma agenda política muito importante. Podemos fazer uma comparação com os ajustes estruturais neoliberais que aconteceram na década de 90. Naquela época, se formou o famoso Consenso de Washington, para liberalizar os serviços públicos e colocar em curso todos os processos de privatização que nós vimos nas décadas de 1990 e 2000. E agora que o capitalismo está em crise, ele tenta se inovar e forjar novas formas de acumulação que precisam dos Estados, das políticas públicas e de leis para oferecer novas fronteiras de acumulação. E essas fronteiras estão em grande parte no meio ambiente. A economia verde consiste em ‘comodificar', tornar papel moeda, todos os componentes da natureza, seja a biodiversidade, a água ou o carbono", explicou Lúcia Ortiz, do Núcleo Amigos da Terra Brasil, durante o Seminário Rumo a Rio+20: por uma outra economia, realizado em Porto Alegre, durante os dias 23 e 24 de janeiro.


O seminário foi organizado por algumas das entidades que compõem o Comitê Facilitador da Cúpula dos Povos - Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (ASPTA), Fase - Solidariedade e Educação, Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES), Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, Núcleo Amigos da Terra Brasil e Sempreviva Organização Feminista (SOF). Durante dois dias de discussões, representantes dessas e de outras organizações do Brasil e de outros países detalharam os acordos que a ONU pretende fechar na Rio+20 e o modelo de desenvolvimento que a organização defende. "Precisamos manter um campo crítico, porque virá com muita força a tentativa de legitimação das corporações, articuladas em torno da economia verde. Precisamos reunir argumentos críticos contra isso e mostrar nossas experiências contra-hegemônicas levando para o debate público nossas propostas", definiu a coordenadora da Fase, Fátima Melo, na abertura do seminário.


Para Pablo Bertinat, da organização argentina Taller Ecologista, duas décadas após a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, conhecida como Eco 92, o balanço é de que não houve nenhum avanço nas políticas para frear o processo de degradação do meio ambiente e da qualidade de vida no planeta. "Quando fazemos a revisão dos 20 anos da Eco 92, percebemos indicadores preocupantes. Há mais gente vivendo na miséria e um incremento na perda de biodiversidade. Isso mostra que as propostas da Eco 92, implementadas através da Agenda 21, são um grande fracasso. A alternativa que permeou a Eco 92 foi a liberalização do comércio e a maior circulação de mercadorias. Da década de 1960 até 2010, foram incrementados os processos de circulação e acumulação de capital e as exportações mundiais cresceram. As exportações da China, por exemplo, cresceram 268%, do Brasil, 32%, e da Argentina, 21%, mas os problemas do meio ambiente e das pessoas continuam", disse.


De acordo com Camila Moreno, coordenadora de sustentabilidade da Fundação Heirich Böll, também presente no seminário, o pilar do novo momento de acumulação do capital que representa a economia verde é o conceito de capital natural. "Eles não estão inventando a roda, simplesmente olharam para o que já está criado e disseram: ‘como não nos demos conta de que as abelhas prestam um serviço e que isso tem um valor! Se não tivéssemos as abelhas, quem iria polinizar?' Então, se contabilizam todos esses processos. 


Existem cálculos, por exemplo, sobre o quanto deve-se pagar pela vazão de metro cúbico de água por segundo. É isso que as corporações e os governos irão tentar legitimar na Rio+20", explicou. "Assim, a água doce disponível do Brasil vai ser transformada em algo que será contabilizado na riqueza nacional. Nada contra contabilizar os recursos naturais, a questão é dentro de qual projeto isso se insere e para quais fins. E os fins são lançar isso no mercado de commodities", acrescentou.


Para Pablo Solon, ativista boliviano que já representou o seu país nas negociações da ONU sobre a Rio+20, é preciso ter uma posição categórica de rechaço à economia verde. "Se não fizermos isso, seremos cúmplices do lançamento de um dos maiores negócios de saque dos serviços da natureza, que será lançado no Rio de Janeiro, durante a Rio+20. Há muitos interesses e milhões de dólares em jogo. O mercado de carbono está em crise, mas gera 180 milhões de dólares ao ano. Então, estamos falando de um mercado multimilionário que, conforme acreditam, reverterá essa taxa decrescente de ganhos do sistema capitalista", alertou.
Especialistas dizem que ONU e governos estão cooptados pelas corporações
Os participantes falaram também sobre a cooptação da ONU pelas grandes empresas multinacionais que, segundo eles, têm hoje um peso muito maior nas decisões da Organização do que os próprios países. De acordo com Lucia Ortiz, já na avaliação feita dez anos depois da Eco 92, foi reforçado o discurso de que os estados não conseguiam gerir os recursos naturais e, paulatinamente, as corporações foram sendo legitimadas. "Existia o discurso de que a ONU estava falida e os estados não conseguiriam gerenciar o meio ambiente, mas as corporações iriam ajudar. E as corporações serão legitimadas finalmente como grandes atores indutores, promotores ou agentes do desenvolvimento sustentável", lembrou.
Lúcia acrescentou que, diante da crítica e das tentativas dos movimentos sociais de controlar as ações dessas multinacionais e criminalizá-las pelos danos ambientais que causavam, foram inventados outros conceitos e mecanismos que novamente apostavam nas empresas como agentes do desenvolvimento sustentável. "A resposta a essas críticas lá em Joannesburgo [na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio + 10] foi a responsabilidade social corporativa. O discurso era: ‘basta que as corporações criem os seus balanços sociais, ONGs e fundações para ajudar no desenvolvimento sustentável e coloquem isso em seus relatórios'. E o rascunho zero da Rio +20 propõe a mesma coisa: ‘as corporações precisam melhorar os balanços de sustentabilidade', diz o documento. Para eles, isso é o controle das corporações", criticou.
Para Lucia, o problema é ainda mais grave porque além das corporações terem "capturado" a ONU, com uma grande presença nas convenções da Organização e, inclusive, com assentos e uma grande visibilidade, essas multinacionais têm presença muito forte também nos governos. "Não importa o partido, são as mesmas corporações que financiam todas as campanhas, e todos os governos estão ali a serviço de todas essas corporações. Junto aos governos e ONGs que elas financiam, as corporações articulam as políticas que definirão as formas de ajuste para o novo ciclo de acumulação do capitalismo", reforçou.
Camila Moreno observou que, desde 2006, todas as agências da ONU consolidaram informes sobre a economia verde, como os Programas das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e para o Meio Ambiente (Pnuma), a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Ela explicou que, da mesma forma, os principais bancos, os think-thanks corporativos (agências que forjam o pensamento corporativo e atuam em fortes setores de looby) e as organizações que Camila chamou de "ONGs de mercado", além das consultorias, estão construindo as bases para o capitalismo verde.
"Essas consultorias estão atuando não apenas para empresas, mas também para países. No Brasil, a consultoria McKinsey & Company foi a que mostrou o plano de desenvolvimento de baixo carbono para o país. Todos os agentes públicos que eu pude assistir em 2008 e 2009 fazendo apresentações - ministérios da Fazenda, do Meio Ambiente e do Planejamento - usavam os slides dessa consultoria. E eles contavam achando muito bom que quem pagou essa consultoria caríssima foi o governo da Inglaterra. A história que eles contavam parecia uma história colonial ou uma telenovela mexicana. Diziam que o príncipe Charles foi à Amazônia, se emocionou e disse que precisava ajudar o Brasil. Então, ele pagou essa consultoria, que é um plano de negócios para o país se aventurar na incrível aventura da economia verde. A McKinsey & Company também foi a principal formuladora de políticas públicas na Guiana, na Indonésia, na Bacia do Congo, viajou o mundo inteiro", informou.
De acordo com Camila, as universidades estão reproduzindo o discurso hegemônico da economia verde como a solução para a crise ambiental. Ela recomendou a leitura de um documento chamado Visão 2050, escrito pelo Conselho Empresarial Brasileiro pelo Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). Segundo Camila, o documento é uma versão brasileira de outro documento que foi construído pela principal coalizão de corporações internacionais. "O documento divide o período de 2010 até 2050. Eles fazem um corte e chamam o período de agora até 2020 de adolescência turbulenta. E, daí em diante, consideram como a consolidação de um novo futuro. É interessante porque o planejamento de políticas públicas no Brasil, na União Européia e em vários países também faz um cronograma até 2020, até porque é nesse período que começa a valer o novo acordo climático, e depois continuam até 2050. Com isso, podemos perceber que essas metas não estão dissociadas de um planejamento que já está em marcha, que visa uma redivisão do trabalho, mas principalmente da acumulação de capital", detalhou.
A pesquisadora falou também sobre o recente lançamento da chamada Bolsa Verde do Rio de Janeiro, um dos aparatos já criados pelo governo do estado para operar as transações das commodities da natureza no âmbito da economia verde. Camila relatou que o presidente da bolsa é o brasileiro Pedro Costa Moura, criador em Oxford da Eco Securities, uma empresa que foi comprada em 2008 pelo banco Morgan Stanley. "Essa transação entre a primeira companhia internacional de vendas de serviços ambientais comprada por um banco do porte do Morgan Stanley foi o sinal de que o sistema financeiro entrou na fase dos ativos ambientais. E o Pedro Moura, que é o arquiteto de tudo isso, foi trazido a peso de ouro para o Brasil para ser o presidente geral da Bolsa Verde do Rio. Embora a bolsa tenha sido inaugurada em dezembro, vão fazer como em Wall Street [bolsa de valores de Nova York] e vão bater o sino para iniciar as negociações durante a Rio+20", comentou.
Segundo Camila, a Bolsa Verde do Rio irá vender cotas de carbono, pois o estado do Rio será um dos primeiros a ter um sistema estadual de comércio de carbono. "Também irão vender cotas de direito de lançamento de dejetos químicos na Baía de Guanabara, porque eles [os criadores da bolsa] entendem que as empresas que estão poluindo têm um direito adquirido de lançar poluição, então, vão distribuir cotas e depois as empresas que se entendam entre elas. Vão vender ainda créditos de carbono oriundos de um acordo com o Acre, que também tem uma lei estadual que vai gerar carbono. E para meu estarrecimento final, eles venderão cotas das Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs), porque é um pré-requisito da economia verde a segurança para o consumo. Então, as empresas têm que investir na infra-estrutura social. É o que já está acontecendo, pois quem banca uma série de UPPS no Rio de Janeiro não é o orçamento público, mas o Eike Batista, que fez uma doação", relatou.
Soluções para a crise do capitalismo
Os participantes do seminário conversaram ainda sobre as práticas e experiências que os movimentos sociais, comunidades e entidades da sociedade civil já acumularam na direção de outras soluções para a crise do capitalismo. Para o economista Marcus Arruda, do Instituto de Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs), entre as estratégias para derrubar falsas soluções como a da economia verde, é preciso construir uma nova sociedade, mesmo dentro das condições adversas do capitalismo. Ele citou entre os exemplos de experiências de "uma outra economia", a economia solidária. "É um nome bonito e inovador, mas a luta é por uma sociedade socialista e democrática, porque o objetivo é quebrar o sistema de propriedade e de distribuição da riqueza que o capitalismo instaurou e transformou num paradigma. No Ceará, há uma cooperativa de trabalhadores rurais que produz algodão orgânico, eles não têm patrão, a terra é de propriedade da cooperativa, cada família que trabalha e produz é co-proprietária e co-gestora de um empreendimento. Ali, nesse espaço micro, o capitalismo morreu, já cedeu espaço para uma outra forma de organizar e gerir a produção", descreveu.
De acordo com o economista, existe uma noção equivocada de que a economia solidária é um conjunto de cooperativas e associações auto-gestionadas dispersas pelo mundo. "A economia solidária é muito mais do que isso, é um projeto de uma outra economia. Essa cooperativa do Ceará, por exemplo, faz parte de uma cadeia produtiva do algodão orgânico que é toda trabalhada de forma solidária, vendendo os produtos umas para as outras desde a matéria prima até as roupas, que são o produto final. Dessa maneira, enquadram e encaixam dezenas de cooperativas num processo de produção solidário, que depois leva os produtos para mercados no Brasil e no exterior", completou.
Jean Marc, da ASPTA, ressaltou que atualmente há melhores condições para os movimentos sociais reafirmarem a urgência e viabilidade de práticas contra-hegemônicas como a agroecologia. "Na ECO 92, nós tínhamos no mundo um conjunto de experiências ainda bastante precário, com muitas esperanças, mas com poucas evidências. Apenas começava-se a falar da agroecologia como uma alternativa estrutural para a crise da agricultura. Hoje, nós temos essas informações e esses comprovantes, inclusive por organismos como a FAO. Há várias evidências de que a agroecologia é capaz de alimentar o mundo e é extremamente poupadora de insumos não renováveis. E também está evidente que a agroecologia bate de frente com qualquer solução capitalista", afirmou. “Apenas a agricultura camponesa vai alimentar o mundo no momento de crise”, diz especialista.

EPSJV/Fiocruz/EcoAgência

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Debates da Rio+20 devem destacar economia verde como alternativa mundial


O governo brasileiro pretende aproveitar os debates da Conferência Rio+20 para destacar, como alternativa mundial, o desenvolvimento da economia verde por meio de incentivos à melhoria da qualidade de vida das populações, erradicando a pobreza e estimulando a sustentabilidade. Essa alternativa deve ser associada aos programas de transferência de renda, como os adotados no país, e aos números positivos da economia nacional.
Uma das preocupações do governo brasileiro é incluir essa determinação no documento final, no qual estarão definidas as metas para o desenvolvimento sustentável nas próximas duas décadas e que serão adotadas por todos os participantes da Rio+20. A ideia é aprovar um documento como o definido pelas Nações Unidas, em 2000, quando foram estabelecidas as Metas do Milênio.
No documento Metas do Milênio, da Organização das Nações Unidas (ONU), os objetivos se concentraram nos seguintes pilares: combate à fome e à pobreza, educação básica de qualidade para todos, igualdade entre sexos e valorização da mulher, redução da mortalidade infantil, melhoria da saúde das grávidas, combate à aids e à malária, estímulo ao respeito ao meio ambiente e incentivo ao trabalho pelo desenvolvimento.
Os ex-presidentes da República Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso, Fernando Collor de Mello e José Sarney (PMDB-AP), presidente do Senado, foram convidados a participar das discussões na conferência, a exemplo do que ocorreu em março do ano passado, durante a visita do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.

Brasil quer que pessoas com deficiência participem dos debates da Rio+20


A menos de cinco meses da Conferência Rio+20, no Rio de Janeiro, que ocorrerá de 13 a 22 de junho, a presidenta Dilma Rousseff determinou que os debates garantam o acesso às pessoas com deficiência e aos representantes de entidades civis organizadas. A ideia é transformar a Rio+20 na maior conferência mundial sobre preservação ambiental, desenvolvimento sustentável e economia verde, definindo um novo padrão para o setor.
Pelo menos 100 presidentes da República e primeiros-ministros são esperados, além de 50 mil credenciados. Os demais números referentes às pessoas que trabalharão no evento – direta e indiretamente – e visitantes ainda estão sendo calculados.
Às voltas com a organização da conferência, o diplomata Laudemar Aguiar, secretário nacional do Comitê Nacional da Rio+20, finaliza os preparativos dos locais onde ocorrerão todos os eventos. Paralelamente, ele coordena o processo de licitações envolvendo todos os segmentos do encontro. Em entrevista à Agência Brasil, Aguiar disse que o desafio é correr contra o tempo e realizar tudo o que está planejado.
“Queremos assegurar que todos consigam se deslocar com o máximo de facilidade possível. Também vamos garantir que pessoas com deficiência e entidades civis participem dos debates. As discussões centrais ocorrerão no Riocentro [na Barra da Tijuca, zona oeste], mas há programações no centro do Rio e também no Flamengo [zona sul]”, disse Aguiar.
De acordo com o secretário nacional da Rio+20, o objetivo é fazer com que a conferência gaste o mínimo de papel, atuando de forma coerente com a chamada economia verde, e ao mesmo tempo garanta maior participação física e virtual dos interessados nos temas debatidos. “É um desafio. Mas estamos trabalhando incansavelmente para atingir essas metas”, acrescentou.  
A Rio+20 ocorre duas décadas depois de outra conferência que marcou época, a Rio 92. O objetivo agora é definir um modelo internacional para os próximos 20 anos com base na preservação do meio ambiente, mas com foco na melhoria da qualidade de vida a partir da erradicação da pobreza, por meio de programas sociais, a economia verde e o desenvolvimento sustentável para uma governança mundial.
A conferência conta com o apoio e o comando da Organização das Nações Unidas (ONU). O secretário-geral do encontro é o diplomata chinês Sha Zukang. A presidenta da conferência é Dilma Rousseff.

Agência Brasil 16/01/2012